23 Apr 2008

Chicken au piri-piri


Fui ver um filme de Ingmar Bergman.
Entrei ao intervalo e saí dez minutos depois.
Não percebi nada mas gostei imenso.

É mais ou menos nestes termos que o Historiador José Pacheco Pereira analisa o pastiche que se fez sobre a Guerra em África.
Ele “ não teve ocasião de ver os episódios da série sobre a guerra colonial que o Joaquim Furtado fez para a RTP” mas “tem visto agora alguns episódios referentes ao ano de 1961” e por isso “junta-se tardiamente ao coro dos louvores”.
E faz muito bem porque fala em causa própria.

José Pacheco Pereira desertou ao serviço militar.
Fugiu para Paris de França com o rabinho entre as pernas como alguns, uma ampla minoria, assim fez.
Mas, dentro de cada português há sempre um poeta e não é que este ilustre fazedor da história consegue identificar-se
“com aqueles soldados e oficiais portugueses que em 1961, quase sem nada, foram mandados para uma guerra para que não foram preparados, perdidos no meio das matas perante um inimigo invisível.”
Absolutamente extraordinário.
Imaginação assim brilhante só Emílio Salgari que bem dentro de Itália donde nunca saiu conseguia imaginar Pacheco Pereira Sandokan, O Tigre de Mompracem a caçar tigres e outras coisas avulsas.

Não que Pacheco Pereira não saiba o que é correr riscos e sentir na pele o medo da morte.
Pois não é verdade, diz ele que
“o caminho da emigração política era complicado, implicava riscos consideráveis para se passar a fronteira, ou as fronteiras, porque havia duas antes de chegar a França, ambas perigosas.”

Quem é que não se recorda das emboscadas que os nossos heróis que fugiam para Paris tiveram que enfrentar nestas fronteiras.
E os que caíram abatidos pelas balas assassinas dos guardas das mesmas.
Tanta dor, tanto luto.
Alguns, entre os quais este herói escaparam, para hoje puderem vir contar a sua história e maravilharem-se com as histórias dos outros.

E mesmo os que escaparam, como viviam.
Pois, conta-nos o historiador
“os que recusaram a guerra viveram com muitas dificuldades, trabalharam como contínuos, em fábricas, em restaurantes, em hotéis, em aviários, numa profusão de profissões menores”

Profissões menores, estão a ver?
Eu, espero sinceramente que os funcionários que servem este ilustre vulto nos restaurantes, nos hotéis e sim, nos aviários, pois o que menos nos falta em Portugal são generais e oficiais de aviários, se lembrem que são profissões menores.


Tenente-Coronel Maçanita, desculpe-o se puder!

3 comments:

Anonymous said...

Eu compreendo que se sinta incomodado por quem manda postas de pescada sobre uma realidade que só conhece de (muito) longe, mas o seu texto também revela alguém vencido e frustrado por um passado que não é capaz de ultrapassar como folha virada do grande e soberano livro da história. Realidade, aliás, ainda muito presente nos chamados retornados da geração do regresso. Ultrapasse isso, homem! Lembre-se daqueles que aos vinte anos foram brutalmente arrancados à família, aos amigos, ao seu mundo e mandados em nomes da pátria para a guerra num fim do mundo qualquer, passaram o diabo a sete, tiveram a sorte de regressar, ultrapassaram os fantasmas da noite e hoje encaram esse passado apenas como isso, o passado, com todos os seus factos equilibrados e devidamente arrumados.
Eu fui um deles!

Xelb said...

JPP nem sabe quem foi o coronel Armando da Silva Maçanita...

fado alexandrino. said...

Muito obrigado.

Eu fui um deles!

Eu também, e é em nosso nome que não podemos deixar passar em claro estas manifestações tardias de coragem-covarde.
Quem fugiu, fugiu!
Não vale a pena agora virem dizer que de repente, por casualidade quando foram chamados para a tropa, que se descobriram valorosos anti-colonialistas.